O DIÁLOGO ENTRE LEITURA, LITERATURA E
EDUCAÇÃO AMBIENTAL
COMO TUDO COMEÇOU: TRILHOS E TRILHAS PARA A SENSIBILIZAÇÃO E O ENCANTAMENTO
Desde criança, bem pequena, sempre ouvi de
meus pais e meu avô materno (que morava conosco e, também era um nato contador
de histórias), que devíamos cuidar do ambiente com o qual convivíamos que a
“Terra era a nossa casa” e por isso precisava ser tratada com carinho.
Costumávamos acampar com frequência naquela época, sempre à beira de rios e,
era do rio que tirávamos a água para o consumo. Naquele tempo isso era
possível.
Quando adulta, tive sempre a preocupação
de educar minhas filhas da mesma forma que fui educada e, como faziam meus pais
e meu avô, através do exemplo.
Quando iniciei minha caminhada no
magistério, já com 41 anos, busquei sempre, trabalhar com meus alunos projetos
que envolvessem a temática
ambiental e propiciassem processos de conscientização, levando-os a perceberem
que todos nós fazemos parte do meio ambiente.
Alguns fatos pitorescos marcaram essa
trajetória, rendendo o início ou a ampliação de projetos. Ainda como estagiária
do magistério, havia desenvolvido um projeto com minha turma, uma 1ª série[1], onde o problema a ser
resolvido era a preservação de um grupo de quero-queros que habitavam um
terreno baldio, que ficava do outro lado da rua da escola e que podíamos ver da
sala de aula. As “pobres aves” eram alvo de pedradas por parte de alguns
meninos e os ninhos, quando encontrados eram destruídos.
Para minha surpresa, certa manhã, um aluno
veio me dizer: “Viu professora, como foi bom à gente aprender a cuidar dos
pássaros. Agora o Marcelo achou aquele passarinho machucado, lá na casa dele, e
trouxe pra gente cuidar.” Ao verificar a informação, descobri que Marcelo havia
encontrado um filhote de bem-te-vi, já com penas, que havia caído do ninho. E
agora, o que fazer? Devolver o bichinho ao “lar” era impossível! Conseguimos
uma gaiola emprestada na vizinhança, colocamos o filhote lá e começamos a
tratá-lo com papinha de farinha de milho, depois minhocas e, à noite e finais
de semana eu o levava para casa a fim de alimentá-lo e também, com a casa
fechada, soltava-o para que aprendesse a voar. Isso durou aproximadamente um
mês e meio, até que fomos ao parque Floresta Imperial, em Novo Hamburgo e
naquele lugar o “nosso bem-te-vi” pode voar livre e solto.
Desde que iniciei no magistério, busco sempre a formação continuada,
tendo plena consciência de meu inacabamento. É através da ação-reflexão-ação
que busco melhorar minha prática.
No ano de
2007 comecei a desempenhar minha prática pedagógica como professora
bibliotecária e responsável pela Hora do Conto, com alunos de 1º ao 5º ano.
Além disso, realizava um projeto chamado “Sacola Ambulante”, que consiste em
sacolas com variado e farto material de leitura, disponibilizadas aos
estudantes que as levam para casa compartilhando o mesmo com toda a família.
Para que
tenhamos resultados satisfatórios é necessário repensar tempos e espaços
escolares; criar redes e promover diálogos. Em Freire podemos ver que a leitura do mundo precede sempre a
leitura da palavra. A leitura do seu mundo foi sempre fundamental para a
compreensão da importância do ato de ler, de escrever ou de reescrevê-lo, e
transformá-lo a partir de uma prática consciente. É essencial que saibamos
valorizar a cultura popular em que nosso aluno está inserido, partindo desta
cultura, e procurando aprofundar seus conhecimentos para que participe do
processo permanente da sua libertação.
“A biblioteca popular como centro
cultural e não como depósito silencioso de livros, é vista como um fator
fundamental para o aperfeiçoamento e a intensificação de uma forma correta de
ler o texto em relação ao contexto.” (Freire, 1988, p.38).
O Curso de Especialização em Educação
Ambiental, com certeza veio ao encontro das necessidades que tinha de ampliar
conhecimentos, de analisar e refletir sobre as minhas convicções a respeito da
importância da leitura para a sensibilização do sujeito em relação às questões
ambientais e, assim, qualificar minha práxis e contribuir para uma Educação
Ambiental crítica e solidária.
“Há possibilidades para diferentes
amanhãs. A luta já não se reduz a retardar o que virá ou a assegurar a sua
chegada; é preciso reinventar o mundo.” (Freire, 1995. p.40).
O Projeto que desenvolvi no referido curso teve como objetivo sensibilizar os alunos da EJA
(Educação de Jovens e Adultos) e, a comunidade escolar para os problemas
ambientais, em especial a grande quantidade de resíduos sólidos existentes
pelas ruas da Vila Progresso e Vila dos Tocos, através
da Hora do Conto, de reuniões semanais com alunos, professores e agentes
comunitários, bem como, da “Sacola Ambulante” levando a boa leitura além dos
muros da escola, objetivando estimular esse hábito nos educandos e comunidade
escolar, criando interesses de leitura permanente, construindo e reconstruindo
aprendizagens significativas. Através das histórias traçamos paralelos entre
ficção e a realidade, refletindo e analisando sobre fatos ocorridos nessas. O
diálogo, sempre promovido nesses momentos, buscou interpretar e refletir
sobre as falas, durante e após a realização das atividades, deixando
transparecer uma memória viva na qual o sentido das coisas é reconstruído.
Acredito, piamente, que a leitura amplia horizontes,
permite ao leitor ver e ler o mundo com outros olhos e, com esse “novo olhar”,
sensibilizado, transformá-lo. Somente uma comunidade sensibilizada com os
problemas ambientais que atingem a “sua aldeia” e, com o sentimento de pertença
fortalecido, pode intervir de fato para transformar a realidade.
Nesse sentido, Freire leva-me a refletir/agir
quando afirma:
“Urge que
assumamos o dever de lutar pelos princípios éticos mais fundamentais como o
respeito à vida dos seres humanos, à vida dos outros animais, à vida dos
pássaros, à vida dos rios e das florestas. Não creio na amorosidade entre
mulheres e homens, entre os seres humanos, se não nos tornarmos capazes de amar
o mundo. A ecologia ganha uma importância fundamental neste fim de século. Ela
tem de estar presente em qualquer pratica educativa de caráter radical, crítico
ou libertador [...]. Desrespeitando que todos têm consciência que são parte deste Meio
Ambiente que precisa, com urgência os fracos, enganando os incautos,
ofendendo a vida, explorando os outros, discriminando o índio, o negro, a
mulher, não estarei ajudando meus filhos a serem sérios, justos e amorosos da
vida e dos outros...”. (2000, p.66-7)